quarta-feira, 2 de maio de 2007

JORNAL DE NOTICIAS – NORTE À BEIRA DA ÚLTIMA OPORTUNIDADE

"O Norte está no seu pior momento". A frase é do presidente da Comissão de Coordenação do Norte (CCDRN), Carlos Lage, mas basta olhar para alguns indicadores económicos e percorrer as ruas das maiores cidades ou das vilas mais pequenas para se perceber que a base económica tradicional está a desaparecer e que o peso dos seus representantes políticos é cada vez menor. No global, vive-se hoje pior no Norte do que há uma ou duas décadas e a qualidade de vida não pára de diminuir.Há vinte anos, o Norte ostentou o título de uma das dez regiões mais industrializadas da Europa, lembra Valente de Oliveira numa entrevista a publicar amanhã; em 2004 (últimos dados disponíveis), estava em quarto lugar, mas no ranking das mais pobres e a uma distância cada vez maior dos parceiros europeus. Entre os Quinze, só três regiões (todas elas gregas) produzem menos riqueza por habitante.A completa reviravolta no nível de vida das populações também é óbvia quando se olha só para Portugal. Há uma década, o Norte estava à frente do Centro e Açores e empatado com o Alentejo; em 2004 foi, de longe, a que menos riqueza por habitante produziu.Tão sustentada tem sido a decadência económica dos últimos anos, com impacto directo na qualidade de vida das gentes, que há investigadores a duvidar da sua capacidade de recuperação. É já claro que acabou o modo de vida que fez do Norte a região mais rica de Portugal. O que se segue pode ser uma espiral de perda, da qual dificilmente se sairá. Ou uma nova filosofia de trabalho que volte a fazer do Norte um motor económico do país.Depois do diagnósticoTodos os avisos estão feitos e todos os caminhos apontados. E até o dinheiro necessário vai ser posto no colo das gentes do Norte por Bruxelas. O Quadro de Referência Estratégica Nacional (QREN) será o último grande pacote financeiro a que Portugal, e o Norte, terão direito. Se repetir o que fez nos últimos 20 anos e desperdiçar esta verba, de 2,7 mil milhões de euros, poderá nunca mais encontrar oxigénio suficiente para sobreviver. Quanto ao que fazer com os milhões de Bruxelas, as soluções são relativamente consensuais e passam sobretudo por produtos e formas de trabalhar inovadoras, de valor acrescentado. É precisamente o que têm feito algumas empresas, até dos sectores em crise como o têxtil e o calçado, mas não a vasta maioria, que já começou a desaparecer e a arrastar o Norte para o mais alto nível de desemprego do país.A nível político, descentralização é a palavra mais ouvida, seja através da transferência de competências para entidades mais próximas dos cidadãos, seja pondo no terreno a regionalização. Antes dessa transferência (ou no seguimento dela, defendem alguns especialistas) são precisos líderes capazes de reunir competências em torno de objectivos comuns - um apelo repetido, mas ainda com pouco impacto prático. Bairrismos à partePara que as soluções cheguem ao terreno é primeiro preciso que todo o país, e não apenas a região, tome consciência da perda global que representa um Norte fraco e deprimido. "É uma questão nacional, não regional", lembra a deputada europeia Elisa Ferreira. É por causa do mau desempenho da economia nortenha que Portugal recebeu uma nota negativa na caderneta comunitária, no ano passado. E tudo indica que, pelo menos em alguns indicadores, a situação ficará pior antes de melhorar. É o caso do agravamento do desemprego na região, dado como certo por várias pessoas ouvidas neste trabalho e cujo impacto esperado nas contas nacionais o torna uma prioridade para todo o país.O Norte alberga dois terços dos trabalhadores e responde, ainda hoje, por 30% de toda a riqueza nacional. Não é, por isso, possível esquecer a coesão nacional e pedir um país moderno. E pensar que o Norte é o Porto, deixando de lado o Minho, a raia com Espanha, o Douro ou Trás-os-Montes é desfocar o problema.Os governos têm olhado demasiado para o próprio umbigo para atalhar a crise enquanto é tempo; e os agentes da região desperdiçaram apoios de Bruxelas e têm-se perdido numa miopia pedinchona, sem capacidade para criar dinâmicas virtuosas. Mas tempo é um luxo cada vez mais escasso. E as oportunidades também.
Jornal de Noticias 2007/05/02 - Alexandra Figueira e Carla Soares

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